Tenho atendido gestantes e parturientes que se queixam frequentemente sobre não viver como esperado. Sonhavam em ser “paparicadas” pelos familiares e amigos durante a gestação, participavam e organizavam eventos e aguardavam ansiosamente pelos seus, algum dia. Imaginavam-se ir na maternidade, com os familiares ansiosos pelo nascimento do bebê. Muitas fotos, alegrias, distribuir a cada visitante a lembrança da maternidade, escolhida com tanto prazer.

Nesse momento de Pandemia, muitas mencionam o medo de se contaminar e ao seu bebê. Sentem-se muito fragilizadas e sem o controle de suas vidas, sozinhas, sem poder ter ajuda da família num momento tão novo e estressante.

Quando se trata de primeira gestação é ainda mais preocupante. A maior frustração costuma ser o filho mais velho não poder conhecer o irmãozinho na maternidade como prometido, ou o marido não poder acompanhar o parto por algum risco de contaminação associado à profissão, por exemplo. São referenciados temores tanto no pré como no pós-natal o tempo inteiro. Veio daí a motivação de pesquisar publicações relacionadas à saúde mental das grávidas na Pandemia.

Um estudo específico me chamou a atenção, que ocorreu em Quebec, no Canadá, onde 1258 gestantes preencheram um questionário sobre saúde mental, relacionado ao estresse antes e depois do parto. Foram também utilizados questionários de 496 mulheres preenchidos antes da Pandemia. Os pesquisadores observaram que mulheres vivenciando a gestação durante o período da pandemia apresentaram mais sintomas claros de depressão e ansiedade, mais pessimismo e maiores alterações cognitivas e de humor do que aquelas que vivenciaram a gestação antes desse período. A diferença entre esses grupos foi de quase o 100%, quando comparados os valores percentuais (10,9% contra 6,0%). Nesse estudo não foram avaliadas as gestantes após o parto. Essas informações têm grande importância pois sabemos que sintomas de depressão, ansiedade e eventos traumáticos aumentam significantemente o desenvolvimento de depressão pós-parto. Outros dados vindos da China confirmam esse obtidos pelo estudo, que mostram que medo, isolamento social e falta de suporte familiar provocam efeitos negativos na saúde mental das grávidas, potencialmente afetando seus bebês.

É preciso investigar em toda consulta pré e pós-parto o humor dessas mulheres. Também é importante que amigos e familiares se preocupem em dar suporte emocional às gestantes e mamães recentes, especialmente nesse momento da pandemia.

Publicado por Elizabete Possidente

Formou -se em Medicina em 1994. Foi médica residente do Instituto de Psiquiatria da UFRJ de 1995 a 1996. Defendeu Mestrado em 1997 a 1999 pelo Departamento de Psiquiatria do Instituto de Psiquiatria da UFRJ. Durante muitos anos foi supervisora de Psiquiatria pela Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro. Foi médica perita em Psiquiatria no Manicômio Heitor Carrilho pela Vara de Execuções Penais da Secretaria Estadual de Justiça. Foi médica Psiquiatra e perita em Psiquiatria pelo Ministério da Defesa no Hospital Central do Exército e pela Auditoria Militar. Foi médica Psiquiatra e chefe do serviço de Saúde Mental da Policlínica Newton Alves Cardoso. Tem diversos artigos publicados em revistas médicas. Diversos trabalhos publicados em congressos nacionais e internacionais. Está sempre se atualizando e participando de eventos médicos nacionais e internacionais em Psiquiatria.

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  1. Muito importante essa abordagem. Estou grávida, de 19 semanas, do segundo filho. Lembro a primeira consulta pré-natal, de dentro do carro, sozinha, as ruas vazias, pessoas com máscaras. Tive que entrar no prédio da médica pelo elevador de serviço, garagem fechada. Meio cenário de “walking dead” sabe? Meu coração deu uma disparada, um pânico… mas aí pensei que era só mais uma coisa difícil pela qual estaria passando e já dei conta de tantas outras. Mas tenho certeza de que esse pensamento não teria sido possível se eu não tivesse o suporte dessa dupla mais que especial: seu e da Ana, minha psicóloga 🙂 Obrigada sempre. E vamos em frente!

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