Muitos familiares, pacientes e amigos comentam que não gostam do mês de dezembro, devido ao Natal. Comentam que “se pudesse dormia antes do Natal e acordava só no ano novo”. Falam sobre insegurança, tristeza e exclusão do clima natalino. Em meu consultório, como médica psiquiatra, a cada dezembro preciso atender muitos telefonemas e consultas de emergência, em número claramente maior que nos outros meses do ano. E por que isso ocorre?
Existem diversos fatores que influenciam as pessoas sobre essa sensação desagradável associado ao Natal. A relação infância e família, por exemplo. Há reverberação da memória por flashbacks de muitos natais passados, quando criança. Revive-se uma inocência que não existe mais. Antes problemas familiares se amorteciam com a esperança natalina da reunião familiar, da ceia gostosa e da farra dos presentes. Agora, a situação é outro, somos adultos, responsáveis, e compreendemos mais a vida “como ela é”.
O Natal nos faz reviver várias sensações negativas que pensávamos estivessem guardadas no fundo do nosso baú de recordações. Por exemplo, quando a pessoa passa por um momento de crise dos pais, mas lembra do tempo que todos passavam juntos e felizes. Lembra-se de discussões familiares que muitas vezes acontecem nessa data. Vão para os encontros de família carregando mágoas e sensações ruins, que explodem quando associadas a ingesta alcóolica.
O Natal também reacende vários problemas que a pessoa tenta esconder durante o ano. Muitos conflitos com pais, filhos, sogros, cunhados e outros membros familiares com quem passará o Natal. Problemas familiares que já existiam e que não foram resolvidos durante o ano ressurgem nesse momento. Surgem as desavenças e as vaidades pessoais, problemas financeiros são reforçados. No Natal normalmente lembramos de pessoas queridas já falecidas. Vivemos esse luto reforçado por saudades dos momentos felizes. Mesmo que não passassem o Natal conosco, todas as propagandas, outdoors, programas de televisão e conversas com amigos nos remetem a lembrar.
Este ano, ainda podemos acrescentar motivos relacionados a pandemia. Todos passaram por pensamentos negativos e incertezas associados ao isolamento social e a perdas, o que reforça ainda mais o clima de tensão.
No paralelo a esses sentimentos somos envolvidos em propagandas, festas de finais de ano e compras que soam como uma violência a pessoa que não está vivendo esse clima natalino.
Muitos, então, passam a sentir angústia, cefaleia, ansiedade, náuseas, dores abdominais e insônia. Muitos passam a comer em excesso, abusar da ingesta de álcool e comprar para tentar se empolgar.
Mas o que fazer para tentar reverter ou atenuar essa situação?
Esse sentimento ruim deve ser encarado como uma mensagem positiva. Primeiro não reforce a falta de espírito festivo no Natal, que fica deprimido por essa razão. Quando faz essa afirmativa você envia um estímulo para o cérebro de que esse é um fato e que nada pode ser feito para mudar.
Outro comportamento comum é que quando se sentem estranhas as pessoas interpretam esse sentimento como fracasso. Você pode não estar feliz pelo natal e não ser um perdedor. É como num dia de sol todos estarem curtindo uma piscina ou uma praia, mas você pode não estar nesse clima e preferir outra atividade.
Faça uma reflexão para identificar e entender seus conflitos emocionais, e tentar a resolução. Na correria do dia a dia é comum as pessoas não se permitirem parar e pensar nos seus problemas. É como se não conseguisse tempo para arrumar os armários, e fosse colocando o que não sabe a utilidade numa gaveta ou prateleira da bagunça. Com essa atitude, a casa parece estar bem arrumada, mas vai se acumulando entulhos. Os “entulhos” surgem nessa fase do ano e muitas vezes são novamente mascarados por consumo excessivo, encontros sociais diversos e aumento da ingesta alcoólica e de guloseimas. Assim a bagunça volta para aquela gaveta, e reaparece no próximo Natal.
Aproveite essa fase para “arrumar a gaveta”, colocando o passado a limpo e revendo pessoas e situações que merecem ser valorizadas ou resolvidas.